sábado, 23 de abril de 2011

Exegese do poema mioleba

O poema
gororoba
rebimboca

guariroba
voçoroca
mioleba

A exegese

Primeira parte: reconhecimento de mioleba como a melhor palavra já inventada pela civilização ocidental

O poema apresenta um esquema de rimas em alternância, com cada verso contendo uma polissilaba até o surgimento do elemento surpresa mioleba. Ele surpreende por sua métrica, em três sílabas, e por não constar em nenhum dicionário. A interpretação mais aparente consiste em considerá-lo como forma variante de "me leva", com o "mio" indicando a provenância itálica de seu interlocutor enquanto "leba" demonstra uma variante de "leva" encontrada ao norte de Portugal. Ora, nesse caso, "me leva" gesticula os movimentos migratórios do homem clássico de Roma à Penísula Ibérica, e do homem do Norte a expulsar os mouros ao Sul, e dali para o Novo Mundo, onde hoje, como sempre, procura atingir uma transcendência espiritual, ser levado pela essência divina a um novo plano de existência em 2012. Reconhecemos mioleba, como palavra, como um ato de compressão de toda a história da humanidade em um só ponto: o ímpeto de transcendência e de união física e imaterial entre a essência dos amantes em uma só uterância mágica, mioleba, que possui o poder de iconizar todos os mitos em todas as eras: pois Ulisses, vendo-se perdido no mar, proferiu à deusa: mioleba para perto de minha amada Penélope, que me aguarda; pois Gilgamesh, segurando Enkidu morto em seus braços, não diz mioleba no lugar dele, mas sim mioleba para onde não se pode miolebar; miolebar, um verbo intransitivo, o ato que todos nós fazemos inescapavelmente ao fim de nossas curtas existências. Há nessa palavra algo de belo, pois o seu som nos agrada; nos lembra uma sopa de miolos, a tempestade de informações e os nossos interiores governados por emoções conflitantes e sentimentos que nem sempre podemos controlar; há nessa palavra algo de sublime, pois todos a admiram como algo sobrenatural, uma sentença de encanto e miríade cornucópia de sabedoria, o desejo do homem em tornar-se überhomem, como implora em um ímpeto nietzschiano o garoto almoso que pede "Super Man Dat Hoe", transforme em dama venerada toda prostituta, transforme em adulto vigoroso a criança ainda em formação, deixe no plano da matéria aquelas coisas escritas geneticamente no espectro de intenções mágicas da dupla serpente que forma a internalidade multiplexa ainda não manifesta de nossos seres; e há por fim nessa palavra algo de pitoresco, pois ela desperta uma risada divina, a hilaritas que está no rosto das divindades tântricas e do sábio taoísta que observa as vaidades dos homens. Portanto, reconhecidos os elementos belos, sublimes e pitorescos da palavra mioleba, podemos passar a análise de como ela se integra aos demais elementos do poema.

Segunda parte: reconhecimento do poema de mioleba como a maior obra já escrita pela civilização ocidental

Se mioleba é a palavra mais divina já concebida pelo homem, podemos encarar as demais palavras do poema ao menos como congêneres, convidadas a mesma morada nos céus. Rebimboca se refere àquilo que re-bimboca, que reemboca com uma nuance sensual e feminina inerente a sua constituição; rebimboca é o riverrun em Joyce, é o wu wei em Laozi, é a passagem dos ciclos lunares, é o renovar dos ventres todos meses, é a ida das águas da nascente a cachoeira e de volta aos céus para cair em movimentos sutis e delicados que constituem o seu aspecto pleno de mulher. A ela se associa outra palavra igualmente erótica e feminina, voçoroca, o ventre infinito, que tudo recebe e tudo contém, que carregou e nutriu a todos nós, que deu prazer a outros tantos, que dá prazer a todos nós pelo simples ato de existir, que nos inspira, o lugar de onde viemos e repousamos e refluimos por novas formas. A esse elemento feminino, o poema adiciona outras duas palavras para englobar toda humanidade em toda em plenitude, agora mostrando seus aspectos masculinos. Gororoba iconiza perpétua a condição cômica do homem que, desesperado e sem suporte, nunca come aquilo que deseja no momento de sua volúpia, tendo que se contentar na maioria das vezes com fetiches, fantasias e substituições insuficientes. Ela se compõe de goró e o verbo roubar, o goró que rouba o homem e lhe entrega ao estado de embriaguez, condensando em uma só palavra tanto a ofensa substantiva quanto a alternativa verbal menin, a ira incontida de novos Aquiles que se entregam à barbárie na ausência da figura feminina nem sempre presente. A palavra guariroba, por outro lado, evoca os aspectos positivos da natureza masculina, a palmeira vigorosa carregada por todos os homens, o ímpeto fálico de execução ou como se diz em terras orkúticas, a pegada: guariroba é Priapus em árvore, a palmeira que monumentalmente representa tanto em seu tronco quanto em seus cocos o melhor dos homens; é a bravura e esperteza dos heróis, a capacidade masculina de vencer mares e terras infindáveis para conquistar aquilo de que necessita. Assim, se gororoba e guariroba são fogo e terra, e rebimboca e voçoroca água e ar, mioleba é o éter eterno que tudo isso constitui e tudo abarca, o Tao que paradoxalmente reune os significados complexos tanto do homem quanto da mulher em um só ser que existe no momento do amor incompreensível e informulável. A palavra mioleba contém todo o poema, e contém a si mesma, resultando em um padrão fractal que reproduz eternalmente a glória de ser humano: e por isso, por ser infinita e cheia de mistério, contém todo o universo.

Terceira parte: reconhecimento de mioleba como a única obra que vale a pena ser lida

Para aquilo que concerne as necessidades do espírito humano, o poema mioleba basta como obra-prima suprema ao 
passo que contém em si toda a arte já criada. Ela deve ser o único conteúdo de tatuagens, a única letra de músicas, ensinada nas escolas por toda a vida e cobrada nos exames vestibulares: ela deve ser o instrumento básico de comunicação, uma linguagem que por si só basta e substitui aquela que lhe deu origem. Deve ser gravada em pedra, desenhada nos céus por aviões do exército incessantemente, escutada em murmúrios, gemidos, gritos, conversas, discursos, declarações de amor, teatros e igrejas. Pois por muito tempo vivemos desolados e em perdição, mas agora Abel e Elohim se espelham na terra em uma só forma: mioleba.

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